Os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade considerados na aplicação da pena disciplinar

Por Marcos Joel dos Santos e Lucas de Almeida

Os princípios, sinteticamente definidos como normas gerais a serem seguidas, assim como as leis, são considerados fontes do direito. Embora atualmente, por algumas pessoas sejam criados e invocados princípios equivocada e exageradamente, o que gera uma banalização a que Lenio Streck, em seu artigo “O pan-principiologismo e o sorriso do lagarto” (2012), chama de pan-principiologismo, existem casos práticos que clamam pela incidência de determinados princípios, de que é exemplo a aplicação das penalidades disciplinares aos servidores públicos e os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Em breves termos, a consagrada autora Maria Zanella Di Pietro (2012), ao referir-se aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade ressalta que, enquanto a razoabilidade objetiva impor certos limites à conduta discricionária do administrador, adotando a melhor forma de “concretizar a utilidade pública postulada pela norma”, a proporcionalidade exige da Administração um equilíbrio entre os fins almejados e os meios utilizados para se chegar a tais fins.

Pode-se dizer que os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade estão ligados entre si, pois ambos visam a impor limites ao poder discricionário (juízo de oportunidade e conveniência) da Administração que, embora em certos atos não cometa ilegalidades ao escolher uma opção dentre outras tantas possíveis, não raro, deixa de observar critérios razoáveis e proporcionais, prejudicando os servidores.

No que se refere ao regime disciplinar dos servidores públicos federais, existem penalidades previstas na Lei 8.112, de 1990, que devem ser impostas em virtude de certas condutas proibidas, não sem antes ser conferido ao servidor investigado o exercício do direito do contraditório e da ampla defesa, albergados infra (Lei 8.112/90, art. 153) e constitucionalmente (CF, art. 5º, LV). Com efeito, o art. 127 elenca o rol taxativo de penas aplicáveis aos servidores.

Imprescindível, para melhor elucidação da problemática, a transcrição do art. 128 da Lei 8.112/90, em sua atual redação: “Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais”.

Parece-nos que o objetivo do legislador, ao editar o art. 128, é justamente evitar a aplicação de penalidades de modo não razoável ou desproporcional. Do contrário, não haveria a previsão para serem consideradas a gravidade da infração e, principalmente, os danos causados, as circunstâncias agravantes/atenuantes, ou os antecedentes do servidor.

Assim, bebendo da fonte do Direito Penal, andou bem o legislador ao permitir que, com a redação do art. 128, à infração cometida pelo servidor, seja aplicada sanção justa, nem mais amena, nem mais grave do que deve ser, observando o princípio da dosimetria da pena. É nesse sentido que se assenta a jurisprudência dos tribunais pátrios (MS n. 7.077-DF, 3ª Seção, DJ, 11-6-2011).

Dessa forma, um servidor com maus antecedentes funcionais, que cometa uma infração da qual decorra prejuízos ao serviço público não deve ser punido no mesmo grau do que aquele com bons antecedentes e cujos danos por ele causados à Administração não tenha sido tão grave.

Contribuição importante é trazida por Júlio Cezar Lima Brandão (Brandão, 2012). O autor destaca que, embora em um primeiro momento se possa pensar que proporcionalidade e razoabilidade só possam ser aplicadas em casos que remetam à pena de suspensão, “única que a lei claramente permite a dosagem de um a noventa dias”, em verdade, devem ser observadas em todas as penas. Do contrário, não haveria margem para se considerar os antecedentes e as circunstâncias atenuantes ou agravantes na pena de demissão, por exemplo. De fato, o art. 128 refere-se à aplicação “das penalidades”.

Exemplo dessa situação pode ser encontrado no caso de servidor que obtivera proveito econômico na ocasião de comprovação de despesas com passagens, para fins de recebimento de auxílio-transporte. Em última instância, foi concedida parcialmente a segurança para anular a portaria de demissão e reintegrá-lo ao cargo, oportunizando a aplicação de pena menos gravosa, porquanto o STJ entendeu que não havia sido respeitado o princípio da proporcionalidade (STJ, MS 10.825, Rel. Min. Arnaldo Lima, DJ 12.6.2006).

Desse breve apanhado, conclui-se que, embora existam condutas que exijam a aplicação de determinada penalidade disciplinar, sem que haja margem para grandes interpretações, por outro lado, há outras situações que conferem à Administração a oportunidade de aplicar ao servidor sanção mais adequada, proporcional e razoável. Sem que incorra em ilegalidade, do contrário, ao aplicar a pena disciplinar sem exageros e desproporcionalidades, a Administração estará alcançando o fim almejado pela norma, sem ferir o direito dos servidores públicos a uma justa punição pelo seu ato.